sábado, 24 de outubro de 2009

A Invasão

Louis saiu para uma viagem de estudos geológicos por três meses, no sertão. Longe e sem acesso a qualquer tipo de informação, os dias passaram rápidos e sem qualquer alteração no seu curso. Com grande quantidade de material coletado para as suas análises, ele decidiu que já era hora de voltar. Arrumou todo equipamento de sobrevivência e de pesquisa em sua camionete e seguiu viagem pela estrada de terra esburacada. Algumas centenas de quilômetros depois, ele começou a sentir um clima diferente, não natural. Primeiro, Louis não conseguia sintonizar qualquer estação de rádio (AM ou FM). Depois, estranhou que, ao entrar na BR, não havia ultrapassado qualquer carro, caminhão ou moto. Os veículos que se moviam na estrada estavam em direção oposta a de Louis.

Ao fazer uma curva acentuada à direita, na estrada, percebeu uma aglomeração de automóveis sendo bloqueados por uma bateria de tanques e soldados do exército. Ao se aproximar dessa aglomeração, Louis foi orientado por um soldado a encostar o veículo, fechar os vidros e não sair do carro. Ao redor, as pessoas estavam sendo forçadas, pelo exército, a retornar a viagem. Visivelmente em pânico, as pessoas eram retiradas dos veículos, recebiam sob o corpo um pó branco, tomavam uma pílula e um copo d’água. Depois eram confinadas no carro, os quais passavam por uma ducha que não era água. Ao final, eram orientadas a retornar a viagem ao seu destino de origem.

Preso no carro, Louis não pode fazer nada a não ser esperar sua vez.

- Saia do carro, senhor.

Falou grosso um soldado totalmente vestido de branco, com máscara e luvas impermeáveis. Ele portava um fuzil e uma caneca com o pó para jogar sobre as pessoas.

- O que está acontecendo? Perguntou Louis ao sair do veículo.

- Um ataque. Um ataque terrível!

- Que ataque?

- Não estou classificado para falar sobre isso, senhor. Vire-se e feche os olhos.

O soldado pulverizou Louis e orientou que ele entrasse no carro e fosse em direção à ducha para veículos.

Descontente com a resposta do soldado, Louis correu em direção a um oficial, igualmente de branco, que estava com uma prancheta nas mãos. Mas, antes de alcançar o general, Louis recebeu um golpe por trás, que o deixou desacordado por meia hora.

Ao acordar, Louis se viu algemado pelo punho a uma barra de ferro de um dos tanques do exército. Percebendo o despertar de Louis, o oficial com a prancheta se aproximou.

- Qual é o seu nome?

- Louis. Respondeu com dificuldade.

- Sua profissão?

- Geólogo.

- O que você faz por aqui?

- Estou voltando do campo de pesquisa. Preciso chegar ao laboratório da universidade antes que minhas amostras pecam qualidade. O que houve? Porque não posso seguir viagem? O que é esse pó branco que jogaram em mim?

Louis, nesse momento, recuperou-se e começou a esboçar impaciência.

- Então você não sabe? Perguntou o oficial, admirado pela ignorância do geólogo.

- Sabe do que? O que está acontecendo?

- Quanto tempo você ficou nesse campo de pesquisa? Inquiriu o oficial.

- Uns três meses. Por quê?

- Então você não sabe mesmo! Concluiu o oficial, admirado, agora, com o isolamento do geólogo.

- Sente-se, que vou te explicar. Ordenou o oficial, retirando as algemas de Louis.

- Trata-se de uma invasão de alienígena ou de uma terrível mutação genética. É terrível! Tudo começou numa escolinha de crianças. Os relatos que chegaram são assustadores. As crianças dessa escolinha ficaram assustadas com uma menina em particular. Da cabeça dessa menina, de uma hora para outra, começaram a sair centenas de piolhos. Os piolhos caiam por toda a parte: boca, olhos, mãos e pernas. As professoras disseram que os piolhos caiam aos montes. A menina chorava, mas ninguém conseguia ajudá-la. Em questão de minutos, a menina estava soterrada de piolhos que subiam pelas paredes e caiam nas cabeças das outras crianças, professores e funcionários. O pânico foi geral. Todos os funcionários correram da escola, deixando os alunos sozinhos. As mães e pais das crianças foram chamados às pressas.

- A criança do piolho...

- O que tem ela?

- Ela morreu?

- Ainda não sabemos. O que sabemos é que em torno de meia hora depois, o mesmo fenômeno aconteceu com as outras crianças, funcionários e professores da escola. Todos foram empesteados de piolhos que eclodiam dos ovos e se espalhavam pelas casas, ruas, prédios e bairros da cidade. Em dez horas, toda cidade estava contaminada por piolhos.

- Parece que eles têm um ciclo reprodutor mais veloz que o normal? Perguntou o geólogo.

- Não é só isso. Eles têm outro poder. Aparentemente eles conseguem abduzir as pessoas. Falou o oficial, com uma olhar atônito.

- Como assim?

- A partir dessa invasão, as coisas mudaram muito por aqui. As pessoas infestadas com piolhos não tomam providência para eliminá-los. Elas simplesmente convivem com isso e começam a praticar atos nunca antes praticados.

Que tipos de atos, oficial?

- Elas simplesmente ignoram que vivem em sociedade. É estranho! Parecem que aceitam a sociedade, mas no fundo não se comportam de maneira social. O pior é que, a depender do nível de infestação, as pessoas começam a praticar delitos extremamente graves.

- Não estou entendendo? As pessoas sempre praticaram delitos, por isso existe justiça, polícia e todo aparato de repressão do Estado. Não é mesmo? Contra-argumentou o cientista.

- Claro que sim! Mas agora, agora é diferente. É mais subliminar e, paradoxalmente, mais generalizado. É como se fosse um novo comportamento social. Um novo código de regras. Uma nova postura. Um novo Estado. É como se Thomas Hobbes levantasse de sua tumba e reescrevesse um novo Contrato Social. O Contrato deles, dos piolhos!

- Isto está ficando muito surrealista.

- E você ainda não sabe do pior... No primeiro estágio da infestação as pessoas se comportar de maneira diferente do habitual, como eu te falei: começam a praticar e aceitar pequenos delitos. Estacionam seus carros em cima da calçada; furam a fila; subornam funcionários públicos para terem seus pedidos adiantados; invadem áreas públicas para benefícios particulares; jogam lixo pela janela. O segundo estágio é ainda mais aterrorizante. Inicia quando os piolhos chegam à sua maturidade e o seu poder de abduzir é maior. Nesse estágio, os piolhos conseguem se organizar e fazer seus delitos conjuntamente. São manipulações organizadas da sociedade em benefícios deles, piolhos. Leis aprovadas para beneficiar grupos particulares; organizações financiadas com dinheiro público para atacar e destruir interesses produtivos; desvio de dinheiro em obras superfaturadas; juízes comungados com a bandidagem, libertando marginais de colarinho branco etc. O terceiro estágio é o do colapso.

- Assustador!

- No terceiro estágio os piolhos já não conseguem manter sua estrutura de poder e sobrevivência e começam a morrer. Com isso, o sistema deles implode. Temos relatos de policiais roubando ladrões e não socorrendo a população; juízes libertando assassinos confessos; habeas corpus para terrorista e banqueiros inescrupulosos; políticos pegos com dinheiro na cueca e achando isso normal; embaixadas sendo utilizadas por grupos e interesses duvidosos; diretores de estatais filmados aceitando suborno e nada acontecendo com eles; compra de armamentos sem licitação; helicópteros da polícia sendo abatidos como se fossem brinquedos infantis; médicos roubando medicamentos de hospitais públicos e vendendo em clínicas particulares; educadores utilizando outras pessoas para darem suas aulas etc. O fim desse estágio é a volta à época que não existia com Contrato Social: a selvageria, onde a lei do mais forte prevalece.

- E o que acontece quando se chega nesse estágio?

- Não há muito que fazer. Tentamos pulverizar cidades com o pó anti-piolho, mas fracassamos. Tivemos que dizimar a população.

- Como assim?

- Já jogamos a bomba de hidrogênio em cinco cidades.

- O que? Indagou o geólogo abismado.

- Isso mesmo. Dizimamos toda a população do Rio, São Paulo, Salvador, Belo Horizonte e Recife. Estamos lutando para não fazer isso em outras cidades.

Nesse momento, chega um soldado.

- General?

- Sim soldado?

- Está confirmado. O Congresso Nacional aprovou o aumento do número de vereadores e impediu a CPI dos Sem Terra.

- Sim...

- O QG concluiu que era o último estágio da contaminação e ordenou o lançamento de mais uma bomba. Brasília será dizimada às 19 horas.

domingo, 11 de outubro de 2009

Testamento

Já com suas mãos bem trêmulas, ele encheu a caneta com a tinta que restava em seu tinteiro, apoiou seu o braço na escrivaninha secular de seu escritório, espalhou o papel e começou a redigir:

Toda a minha fortuna, tudo o que consegui construir em minha vida, deve ser tratado da seguinte forma: o capital investido em empreendimentos seguros, pelos meus executivos, deve constituir um fundo. A rentabilidade desse fundo deve ser anualmente distribuída em forma de prêmio para aqueles que, durante o ano anterior, apresentaram excepcional contribuição à humanidade. A referida rentabilidade deve ser dividida em cinco partes iguais, as quais devem ser distribuídas às pessoas que tiverem feito a principal descoberta nos campos da: física; química; fisiologia ou medicina; literatura; e, a última parte, à pessoa que demonstrou ter feito o maior avanço para a fraternidade das nações, para a redução da proliferação das armas e para a manutenção e promoção da paz... É o meu expresso desejo que a premiação não leve em consideração a nacionalidade dos candidatos. O mais valioso candidato deve ser premiado, independente se ele é escandinavo ou não.

O senhor continuou escrevendo, por mais algumas páginas, os detalhes de seus últimos desejos e terminou.

... esses são os meus desejos.

Alfred Nobel


Paris, 27 de Novembro de 1895

Em 1901, o Prêmio Nobel começou a ser distribuído para as pessoas que fizeram extraordinária contribuição à humanidade, no ano anterior, nos campos da física, química, medicina, literatura, paz e, a partir de 1968, economia. Cada prêmio consiste em uma medalha, um diploma pessoal e uma quantia, em dinheiro, equivalente a 1,5 milhão de Dólares.

O primeiro Prêmio Nobel da Paz foi dividido entre o fundador a Cruz Vermelha, Henry Dunant, e o pacifista internacional Frédéric Passy. Desde essa primeira premiação, 90 pessoas receberam o prêmio, dessas 12 foram mulheres. A pessoa mais nova a receber esse prêmio foi Mairead Corrigan, fundadora do Movimento Norte-Irlandês de Paz e que, aos 32 anos, ganhou o prêmio em 1976. A pessoa mais velha foi Joseph Rotblat que, com 87 anos, ganhou o Nobel da Paz em 1995.

Alguns fatos são bem interessantes no processo de escolha do ganhador do prêmio. Hitler foi indicado para ganhar o prêmio em 1939. Stalin foi indicado em 1945 e 1948. Enquanto isso, Gandhi, apesar de ter sido indicado 5 vezes, nuca levou o prêmio.

Outro fato interessante e intrigante é que, geograficamente, os ganhadores do Prêmio Nobel da Paz se concentram no Continente Europeu, continente este promotor das piores guerras da humanidade. A América do Norte está logo em segundo lugar e, assim como a Europa, não é um continente muito amistoso. Depois vem a Ásia, África e, por fim, a América do Sul. O Brasil, que raramente se mete em encrencas internacionais, não tem nenhum ganhador. Aparentemente, quem menos faz guerra menos ganha o prêmio.

Nessa semana foi anunciado o novo ganhador do Prêmio, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. Ele levou a medalha pelo extraordinário esforço na melhoria e fortalecimento da diplomacia mundial, pela cooperação ente os povos, assim como pela redução da ameaça nuclear. Estima-se que, depois dos esforços dele na redução da ameaça nuclear, o Mundo deixou de poder ser destruído algumas centenas de vezes para algumas dezenas de vezes.

Jogo diplomático para melhorar a imagem doméstica de Obama? Candidato realmente merecedor? Comparando com seu antecessor, parece ser um prêmio razoavelmente concedido.


domingo, 4 de outubro de 2009

2010 – 2019: A década brasileira

Rio 40 graus
Cidade maravilhosa
Purgatório da beleza
E do caos

Capital sangue quente
Do Brasil
Capital sangue quente
Do melhor e do pior
Do Brasil

Foi entre a realidade e a fantasia, traduzidos esplendidamente pela música de Fernanda Abreu, que o Rio de Janeiro venceu Madri (Espanha), Tóquio (Japão) e Chicago (Estados Unidos), trazendo para o Brasil e para a América Latina as primeiras olimpíadas: as de 2016. O Rio, uma cidade de cidades camufladas, esconde e revela segredos de um Brasil para os futuros visitantes e bastantes desafios a serem vencidos pelos brasileiros.

Quem pôde assistir ou ouvir a apresentação das delegações na cerimônia de escolha da cidade a sediar as Olimpíadas de 2016, em Copenhague, se impressionou e até se emocionou com a vitória brasileira e carioca. O empenho dos políticos, atletas e celebridades no corpo-a-corpo antes da votação, assim como a qualidade e uniformidade dos apresentadores e do material e vídeos mostrados foram fatores importantíssimo para essa vitória. O cheque-mate brasileiro ficou por conta do belíssimo e eficaz discurso do Presidente Lula. Esse foi fantástico!

http://www.youtube.com/watch?v=5UIkuI0eyA0

A festa que se deu ao anúncio da cidade vencedora, pelo comitê olímpico internacional, em Copenhague, pode significar, para o país e para o Rio, o início de um novo tempo?

Segundo um recente estudo do IPEA, os exemplos de Barcelona, Sydney e Pequim parecem bem interessantes. Barcelona se transformou após as Olimpíadas de 1992. Uma de cidade eminentemente industrial, estagnada e cinza, passou a ser uma das melhores cidades da Europa. O povo melhorou sua auto-estima. Anualmente, Barcelona recebe milhões de turistas, chegando a ser a terceira cidade mais visitada do velho continente. Em Sydney 2000, o avanço foi nas questões ambientais, como a implantação de técnicas de reaproveitamento de água, energia e lixo e a preocupação com o desenvolvimento sustentável. Em Pequim 2008, a China se apresentou ao mundo de outra forma, derrubando muitos preconceitos e amenizando muitas críticas.

Os impactos que podem surgir na economia e na melhoria da sociedade são várias. Espera-se que o Rio consiga superar graves problemas sociais, incrustados nas inúmeras favelas e nos corriqueiros dramas da saúde, educação, segurança pública e transporte. Do outro lado, os avanços econômicos que o Rio poderá vivenciar parecem mais eminentes e prováveis, principalmente na construção civil e no setor turístico.

A projeção econômica, do Brasil como um geral, é muito boa para os próximos anos, independentemente da ocorrência ou não dos jogos olímpicos. É comum, nos comentários dos especialistas econômicos, escutar que o Brasil atravessou relativamente bem as tormenta da crise financeira. Olhando para os gráficos de bolsa de valores e PIB, percebe-se uma rápida recuperação da economia brasileira. As vendas de veículos nunca foram tão grandes, assim como a arrecadação do Estado.

Além das Olimpíadas, outra ajuda à economia vem da Copa do Mundo de 2014 no Brasil. Esse empreendimento, mais disseminado pelas cidades brasileiras, também promete melhorias incrementais na economia, sociedade e na geração de empregos.

Considerando o entusiasmo do momento, as razões para o ceticismo não são poucas. A concentração de investimentos em poucos locais, os desvios de recursos pela corrupção e a infindáveis obras públicas que se arrastam na construção e dragam dinheiro pelo ralo são alguns dos problemas que iremos enfrentar nessa jornada.

Apesar disso, devemos comemorar e arregaçar as mangas, pois só depende de nós para ser um bom investimento para o Brasil.

Postagens populares