terça-feira, 25 de outubro de 2011

Educação Financeira

Quando assumi o cargo de professor na Universidade Federal de Alagoas, o professor Lucas me convidou a integrar um projeto de extensão, sob sua coordenação, que objetiva a popularização da educação financeira entre estudantes secundaristas. A ideia é proporcionar a essa população conhecimentos e habilidades para lidar com o dinheiro de forma proativa. Questões como a formação de poupança, as alternativas de investimento, a negociação de dívidas e a realização de projetos a longo prazos são exemplo de assuntos desenvolvidos pelo grupo.
Bem... Depois de muita teoria é normal ficar ansioso para colocar em prática os conhecimentos construídos. E foi com muita sede ao pote que me vi aplicando as orientações de uma boa educação financeira logo no início dessa manhã.
Depois de uma boa ginástica matinal, estava eu esperando o corpo voltar ao normal antes de entrar na pousada onde habito em Santana do Ipanema. Na entrada dessa pousada, há uma pequena galeria de lojas, sendo uma delas uma financeira. Entre um gole e outro de água, veio uma senhora caminhando pela calçada e se posicionando próximo a mim. Como sou um pouco alto, eu deveria ser o dobro do tamanho dela. Essa senhora – uma mistura de índio com negro – deveria ter no máximo 60 anos. Só que o sol do sertão e uma vida sentada no cabo da enxada a deixava com uma aparência de bem mais velha. Nesse momento, travou-se um diálogo:

Senhora: aqui faz empréstimo?
Eu: como?
Senhora: essa loja faz empréstimo? (apontou a senhora para a financeira)
Eu: acho que sim.
Senhora: o Sr. sabe a que horas abre? (eram umas 8 horas da manhã).
Eu: não sei não senhora, mas acredito que nessa rua devem ter outras desse tipo.
Eu: a senhora vai fazer um empréstimo? (comecei a me interessar)
Senhora: vou.
Eu: dizem que quem faz um empréstimo numa loja dessa nunca mais consegue se livrar dele. (joguei verde para ver o que colheria)
Senhora: Deus me livre! Quero pagar logo.
Eu: como é o nome da senhora?
Senhora: Maria.
Eu: pois é dona Maria, dizem que os juros são tão altos que você fica sempre precisando de mais dinheiro, mais empréstimo.
Maria: eu sei, mas com fé em Deus eu vou pagar!
Eu: a senhora está precisando mesmo de empréstimo?
Maria: estou meu filho.
Eu: é para pagar uma dívida ou para comprar alguma coisa?
Maria: é para comprar um terreninho.
Eu: e a senhora não pode juntar (poupar) esse dinheiro?
Maria: não meu filho, tem de ser logo!
Eu: pense bem! É melhor juntar o dinheiro do que ficar enforcada para pagar depois.
Maria: mas, é para que meu filho vá morar nele.
Eu: e ele não pode morar com a senhora por enquanto até que a senhora junte o dinheiro e compre o terreno à vista?
Maria: não. Eu quero que ele vá embora logo! (senti o drama)
Eu: então ele vai embora e a senhora é quem vai ficar com a dívida para pagar?
Maria: é melhor assim!
Eu: pense bem! A senhora pode não conseguir pagar o empréstimo e ter que fazer novo empréstimo e ficar cada vez mais endividada.
Maria: Deus me livre! Já reservei o tanto que posso pagar por mês.
Eu: Quanto é que a senhora pode pagar por mês.
Maria: uns 70 reais. É o que sobra!
Eu. Pense bem! Se a senhora não conseguir pagar?
Maria: Deus há de me ajudar para que eu pague tudo.
Eu: eu sei dona Maria. Mas, se um dia, algo de ruim acontecer – um acidente, uma tempestade, uma doença etc. – e a senhora precisar usar esses 70 reais e não tiver como pagar o empréstimo?
Maria: não, não, Deus vai me ajudar! Eu tenho muita fé em Deus!
Eu: não quero dizer que Deus não vai te ajudar... é que, de vez em quando, a natureza foge do controle e uma eventualidade acontece. Ai a senhora vai se endividar mais ainda. É melhor poupar. A senhora já pens....

Não consegui completar o raciocínio. Dando uma desculpa que iria à farmácia, dona Maria saiu sem nem olhar para trás.

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