sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Conversas de paciente em sala de espera (pós-carnaval)

Como normalmente ocorre, após o carnaval as clínicas e os hospitais lotam de foliões averiguando as consequências dos dias de loucura carnavalesca. Há de tudo: homem querendo se recuperar da ressaca, mulher querendo “a todo custo” saber se está grávida e outras mazelas piores, de que não pretendo me prolongar. No meio disso tudo, ainda tem os pacientes corriqueiros que nada têm a ver com a folia. Entre eles, eu, que, “não sei o porquê”, resolvi enfrentar uma dessas salas de espera superlotadas para aproveitar minha estada em Salvador e fazer um check-up.

Quando cheguei à clinica, de cara vi que a coisa iria demorar. Corri para pegar uma senha, mas o número não me animou em nada: 289 de 130 chamadas. Pensei em desistir, porém, como tinha um laptop, resolvi procurar uma cadeira, sentar e tentar trabalhar. Acomodei-me justamente ao lado de um homem que aparentava se bem mais velho que eu (uns 15 anos a mais) e denunciava certo nervosismo. Mal consegui ligar o laptop, o homem puxou conversa.

Homem: olha ai. Tá todo mundo lenhado! Brincaram o carnaval, perderam a cabeça e agora estão todos aqui.
Eu: como?
Homem: é o carnaval, rei! Todo mundo “fode“ sem camisinha e agora vem aqui querer saber se está grávida, se tem AIDS, herpes, sífilis, chagas e o diabo a quatro...
Eu: agora sei por que está cheio isso aqui!
Homem: é rei! O carnaval é “foda”! A galera fica louca! Sai beijando e comendo tudo que encontra.
Eu: loucura, né?
Homem: loucura? Abra a boca dessa galera ai. Tá tudo estourado! Vejo que você não é daqui.
Eu: mais ou menos... sou da Paraíba, mas já moro aqui há tempos.
Homem: Pois você já devia saber da bagaceira que é o carnaval. É tiro. É facada. É roubo. É estupro. É droga...
Eu: mas isso é em todo canto...
Homem: mais aqui é pior! Aqui é coisa é obscena. Vá ao HGE prá ver!
Eu: estou fora! Odeio hospitais.
Homem: Ouvi hoje no José Simão. Você conhece José Simão, né?
Eu: Sim, claro! O Macaco Simão!
Homem: pois. Ele hoje falou que a amiga dele “deu” tanto no carnaval que ficou rouca!
Eu: (risos)
Homem: você pensa que é brincadeira? É não rei! Tá assim no carnaval.
Eu: e você? Não curte isso não?
Homem: curtia... curtia... muito tempo atrás. Quando era solteiro, quando não tinha filhos, quando não tinha essa bagunça toda...
Eu: então faz muito tempo, heim? (sacaneando)
Homem: é rei! Tenho que admitir que a minha época já passou e até que sinto um tanto de inveja deles. Enquanto eles estão querendo verificar da desgraça que fizeram se divertindo, eu estou parecendo um velho precisando de ajuda para mijar.
Eu: não entendi!
Homem: já ouviu falar de incontinência urinária?
Eu: sei...
Homem: pois é. Toda vez que faço xixi, minha bexiga não consegue expelir toda a urina e sempre sobra um teço do volume. Toda hora tenho vontade de mijar. É um saco!
Eu: é por isso você está aqui, hoje?
Homem: Sim. É que, de vez em quando, tenho que fazer uma lavagem da bexiga, pois sempre há o perigo de infecção urinária e formação de pedra. Você já mijou uma pedra rei?
Eu: ainda não.
Homem: nem queira! Para não dar essas tranqueiras eu tenho que me submeter a essa lavagem. Toda vez que venho aqui eles colocam um sonda na minha uretra e injetam soro fisiológico até limpar tudo.
Eu: imagino que deva doer isso...
Homem: doer? Dói muito! Mas é bom...
Eu: Bom?
Homem: Sabe como é.... as enfermeiras que fazem isso aqui são gatinhas. Eu poderia fazer essa lavagem lá na Pituba, mas prefiro as enfermeiras daqui da Garibaldi. Minha esposa pensa que eu venho aqui por outro motivo... (risos).
Eu: é o seu vale night?
Homem: É o que posso fazer rei, para um pouquinho de diversão. Primeiro elas tem de higienizar toda a área do “bilau”, passam uma xilocaína e depois ficam massageando a entrada da uretra.
Eu: massageando?
Homem: é rei! Eu fico pensando em Hitler, na guerra atômica, na derrota do Baêa... em tudo para o “pau” não levantar, pois a coisa vai ficando boa. E o pior é que as safadinhas sabem que o bicho quer acordar e ficam falando baixinho uma para outra, dando risadinhas.
Eu: hahahah... é “foda” mesmo!
Homem: “foda”? Quando a coisa vai ficando boa, quando você desiste de pensar em Hitler... ai ela pega a sonda e enfia com tudo no teu “pau”! Ai é que é “foda”, rei!!!
Eu: Putz!
Homem: É meu camarada... a conversa está boa, mas já estão me chamado. Depois te conto como é o exame de próstata... (risos)
Eu: ok. Mas, ainda vai demorar um pouco. Pense em Hitler, heim!

Depois que ele saiu, finalmente consegui ligar o laptop. Mas, confesso que o resto da espera foi um tanto quanto tediosa e pensativa. Tenho que repensar os meus carnavais, enquanto não ainda preciso de sondas... 

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