quarta-feira, 4 de julho de 2012

Lucro Brasil


Vivemos um período no mínimo estranho. Estamos sendo bombardeados por notícias governamentais e para-governamentais anunciando uma nova era para o Brasil. Uma era de prosperidade “nunca antes vivida” na história – ou será estória? – desse país. Apesar desse otimismo patrocinado, desse orgulho despropositado e desse gigantismo – uma vez que já somos a 6º maior economia do planeta – sem lastro, há um sentimento de falácia pairando no ar.
Exemplos disso podem ser verificados em cada esquina de nossas cidades. Há prédios sendo erguidos em todos os cantos, mas não há mais ruas para se transitar. A inflação oficial apresenta números comportados, mas os preços no caixa do supermercado não param de subir. Há propagandas de que estamos evoluindo nos indicadores sociais, mas os professores estão em greve há quase um semestre. Há anúncio que estamos no pleno emprego, mas me canso de dizer não aos flanelinhas e vendedores ambulantes nos sinais da cidade. Construímos palácios e obras faraônicas – como os estádios de futebol e a transposição do rio São Francisco – para sermos o centro da atenção mundial nos próximos anos (Rio + 20; Copa do Mundo; Olimpíadas), mas ainda pisamos no esgoto quando saímos de casa. Sem dúvida, vivemos numa era de contradições.
Sem ater às questões contraditórias da política – que não são poucas – abordarei nesse post um exemplo dessas contradições: o Lucro Brasil. As pessoas estão consumindo feito umas loucas, sem parar para analisar as consequências para as suas vidas e, principalmente, o real valor dos bens que estão adquirindo. Mais uma vez, estamos deixando para que outros resolvam nossas questões, enquanto nos iludimos com a falácia da nova era brasileira. Um desses exemplos é o do automóvel, mas se aplica a quase tudo.
O Brasil alcança níveis de produção, diversidade e vendas de veículos nunca antes alcançados em sua história. Somos a quarta maior frota de veículos do planeta. Mas, estamos pagando caro demais pelos carros que compramos por aqui. Por quê? Tentando compreender essa contradição, convidei um amigo (Fábio Lourencetti), entendedor do assunto, para participar desse post. Ele respondeu às seguintes perguntas:
Há um movimento no Facebook voltado para que o brasileiro não compre carro em 2012. Do que se trata esse movimento?
O movimento existente é, na verdade, para não realizar a compra de carros zero Quilômetro. Esse movimento está sendo realizado por toda a internet, o Facebook é simplesmente mais um canal para acesso as massas de forma rápida e constante, por intermédio do “Abaixo ao Lucro Brasil”.
O que é o “Lucro Brasil”?
O Lucro Brasil é a margem exorbitante aplicada pelas montadoras em nosso mercado.
Pensa só: o Brasil é o quarto maior mercado consumidor de automóveis do mundo e o quinto produtor, mas não possuímos uma indústria automobilística nacional. A China possui. A Índia e a Rússia também. Isso pensando nos BRIC. Sem indústria própria e com alto consumo, temos então o fato de sermos o primeiro da lista em preços. Um mercado para ganhar dinheiro!
Muitos pensam que o culpado são os impostos, porém a realidade não é bem essa. Vejam que interessante: carros produzidos aqui, em nosso país, e exportados para nossos parceiros comerciais, a Argentina e o México, são vendidos muito mais baratos por lá. Como exemplo se pode citar o City da fabricante Honda. Fabricado em Sumaré interior de São Paulo, é vendido por R$ 31.470,00 no México enquanto no Brasil custa R$ 54.580,00 (versão LX, pois a DX nem é oferecida no mercado mexicano por ser simples demais). Se retirarmos os impostos, que somam aproximadamente 30% do valor brasileiro, teremos um custo de R$ 38.206,00, ou seja, cerca de 21% a mais que no país estrangeiro. Lembrando que o carro é produzido aqui e possui custo de transporte para as revendas de lá. Não retirei a margem da revenda, pois no México a margem também deve existir!
Obs.: O dado do percentual de imposto foi retirado da seguinte reportagem: http://www.youtube.com/watch?v=8AwRr9qM50U 
Os valores dos respectivos veículos foram retirados dos sites da montadora Honda Mexicana e Brasileira.
O que podemos perguntar em seguida é o porquê da diferença, correto?
Pois bem, vamos analisar o mercado presente. Temos cerca de 76% do mercado concentrado em 4 montadoras: Fiat, Volkswagen, Chevrolet e Ford. As quais são denominadas como “as 4 Grandes”, ou seja, essas empresas com produtos desatualizados e precários são os que mais vendem no mercado, o que fez com que montadoras novatas (entrantes) no mercado conseguissem colocar seus produtos classe C posicionados em um patamar de classe A, como o Honda Civic, Toyota Corolla, dentre outros. No México 76% está em 12 montadoras, ou seja, maior concorrência.
Temos também um fato cultural em nosso país, onde é visto normal parcelar um carro em 60 vezes de R$ 700,00. A contradição disso está em acharmos absurdo pagar o mesmo valor por um curso em uma faculdade de engenharia, durante 5 anos, ou seja, os mesmos 60 meses. Comprar carro tudo bem, mas financiar a educação superior, para o brasileiro, é um absurdo!
Podemos citar também a sombra da inflação, a qual assolou nosso país por muitos anos e imobilizar recursos em um automóvel era visto como uma forma de investimento, o que ainda permanece na mente de muitos brasileiros e é o principal argumento para não se abandonar as 4 grandes clássicas de nosso mercado. Ou seja, no Brasil ainda se compra carro pensando na revenda.
Observando a tabela abaixo, onde fora comparada a desvalorização por 3 anos de veículos praticamente de mesma categoria, incluindo duas das 4 grandes, a Nissan e a Renault (duas consideradas de grande risco de desvalorização).
Fonte: http://www.noticiasautomotivas.com.br/confira-a-tabela-comparativa-com-a-desvalorizacao-dos-principais-sedas-do-mercado/

Ou seja, no médio e longo prazo não vemos relativa diferença, porém a revenda é um modelo mental enraizado na mente do brasileiro.
Você não comprará carro Zero?
Em minha visão não precisamos ser extremistas e deixar de comprar carros Zero.  Devemos destruir esses paradigmas que mistificam os impostos como os únicos responsáveis pelo alto preço dos carros. Outro vilão está na concentração do mercado e no consequente Lucro Brasil.
O exemplo da CAOA, que investiu na fábrica da Hyundai, trazendo Know-How ao país e agora com projeto de investir em uma fábrica nacional, nos dá uma esperança de maior concorrência no futuro. (http://www.snn.com.br/noticia/110813/6/caoa-confirma-fabrica-automobilistica-na-paraiba.html).
Ainda não entendo muitas contradições de nosso tempo e de nosso país, mas uma coisa é certa: a origem delas está em nossa passividade perante a realidade que teima em nos desafiar, passando em nossa “cara” o quanto estamos errados nas prioridades que escolhemos.

Imagem: http://devaneios-loucos-de-eliene-almeida.blogspot.com.br/2010/07/eu-sou-como-um-palhaco-triste-que.html


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