11 de junho de 2014, após meio dia.
Um jornalista estava sentado à
mesa de um restaurante no centro do Rio, daqueles restaurantes que se senta ao
balcão, comendo um almoço magro na dimensão de seu salário mensal, quando dele
se aproximou um pedreiro.
— Desculpe-me senhor, mas
gostaria que o senhor escrevesse uma carta para mim.
Assustado, o jornalista respondeu
ao desajeitado pedreiro:
— Eu? Por que eu?
— É que me disseram que o senhor
é jornalista e como tal eu acho que é a pessoa mais certa para me ajudar. Não
que eu não saiba escrever, mas esse tipo de assunto eu não levo jeito.
Curioso com a inusitada situação,
o jornalista indagou:
— E que tipo de assunto seria este?
— Uma carta de amor.
— Uma carta de amor? E para quem
seria?
— Para ela doutor. Para ela!
O pedreiro retirou uma foto de
sua carteira e a entregou ao jornalista.
— E o que você quer que eu diga?
— Não sei doutor. Se eu soubesse
não estaria aqui te incomodando.
Vendo que o jornalista estava
relutante, o pedreiro insistiu um pouco mais.
— Doutor, ela está na Paraíba e
faz mais de um ano que não nos vemos. Quero mandar essa carta amanhã que é dia
dos namorados.
Aquela situação o levou a assumir
a encomenda e durante toda a noite ele, o jornalista, que não tinha um
relacionamento amoroso há muito tempo se colocou a rabiscar e escrever linhas e
mais linhas para ela, a amada do pedreiro. Mas, faltava-lhe inspiração. Como
poderia ele escrever palavras bonitas se ele não estava namorando ou
apaixonado?
A foto entregue pelo pedreiro não
o ajudava muito, pois além desgastada e suja, apenas aparecia parte do rosto da
mulher. Talvez por timidez dela ou falta de habilidade do fotógrafo, o que se
via não revelava muito ao jornalista e depois de quatro doses de whisky barato,
uma carteira de cigarro e uma lixeira cheia de papéis amassados, ele desistiu
da empreitada e simplesmente desmaiou no sofá.
Em seu sono, geralmente profundo,
pois ele só se deitava quando deveras cansado, o jornalista sonhou. E em seu
sonho a mulher do pedreiro apareceu. Das poucas e tímidas imagens do seu rosto
na foto se revelou uma mulher linda e, nessa revelação, ela ficou nua.
Desnudada em tudo e simplesmente perfeita, a mulher sem cerimônia se entregou
ao jornalista que já não sabia como era bom possuir uma mulher com desejo e paixão.
E a paixão foi tanta e o desejo também, que não foi apenas uma vez, mas a noite
toda no deleite de uma deusa que ele, em sua vida real, nunca tivera.
Ao amanhecer, no dia 12 de junho
de 2014, revigorado de um sono que não se quer que termine e, de certa forma
exausto, o jornalista se pôs a escrever freneticamente. Escreveu como jamais
havia escrito, pois amou como jamais havia amado.
Ao ir ao trabalho, o jornalista pôs
a carta em seu bolso, mas não sabia se iria entregá-la ou não. Estavam tão
intensas e profundas suas palavras que ele ficou receoso quanto à possível
reação do pedreiro.
Passou a manhã assim: na dúvida.
Mas, o clima de abertura da Copa do Mundo desviou seu pensamento e já na
concentração para a partida do Brasil e Croácia, em companhia de seus amigos, num
bar de uma das inúmeras esquinas do centro da cidade, ele sentiu um toque em
seu ombro. Era uma mão forte e áspera, mas gentil. Era o pedreiro.
— E aí doutor? O senhor conseguiu
escrever?
Hesitante, o jornalista puxou a
carta do bolso e a entregou. A encomenda foi prontamente lida pelo pedreiro,
que de tão feliz suspirou:
— É isso! É justamente isso que
eu queria dizer doutor. Só não sabia!
Agradecido, o pedreiro saiu
imediatamente para por a carta nos Correios. O jornalista voltou seus olhos
para a TV, junto a seus amigos de bar. Ao som do hino nacional e com a imagem
da Seleção em campo, o jornalista pensou e sorriu, pois nunca imaginara ter uma
noite tão boa justamente no dia dos namorados.
...Seja feliz!
(Adaptado de Carta de Amor de Salomão Schvartzman)