quinta-feira, 4 de junho de 2009

Tragédia

A semana começou com um tipo de notícia que sempre nos abala: a queda de um avião. Tratou-se de um avião da AIR FRANCE que partiu do Rio de Janeiro com destino à Paris. Por infelicidade da tripulação, o avião aparentemente não resistiu a uma zona de turbulência, sob o Oceano Atlântico, apresentando pane elétrica e caindo entre o Brasil e a costa africana.

Também tivemos outra notícia que, há pouco tempo atrás, parecia ser inimaginável: o pedido de concordata da General Motors. Essa empresa fabrica automóvel e é o ícone do capitalismo mundial e, principalmente, dos Estados Unidos. Alguém algum dia poderia imaginar o Governo estadunidense comprando a GM?

São duas notícias que podemos traduzir como tragédias. A primeira envolve a morte de mais de duzentas pessoas, a destruição de muitas famílias e alimenta nossos temores mortais de querer voar. A segunda impacta em nosso estilo de vida, faz muitas famílias perderem emprego e renda e põe uma questão de natureza econômica, social e ecológica para ser resolvida.

Não querendo desmerecer a importância dessas duas notícias, mas, durante o V Reunião da ABAVE (Associação Brasileira de Avaliação Educacional), que está sendo realizada aqui em Salvador, nessa semana, eu obtive uma informação que, para mim, tem um poder mais devastador.

Durante essa reunião, eu participei de um mini-curso intitulado Estudo Longitudinal sobre Qualidade e Equidade no Ensino Fundamental Brasileiro - GERES 2005, proferido pelo Prof. Nigel Brook (UFMG) e pela Profa. Fátima Alves (PUC/RJ). Os professores explicaram o motivo, os objetivos e as características do estudo e, depois, apresentaram alguns resultados que já podem ser extraídos da base de dados.

Na página do Projeto GERES na Internet, podemos encontrar que ele “é um projeto de pesquisa longitudinal que focaliza a aprendizagem nas primeiras fases do Ensino Fundamental para estudar os fatores escolares e sócio-familiares que incidem sobre o desempenho escolar”.

Segundo os professores palestrantes, o GERES tem o como objetivos: (1) identificar as características escolares que mais promovem o aprendizado dos alunos; (2) identificar as características escolares que minimizam o impacto da origem social dos alunos em seus resultados escolares.

Muito bem. Uma das coisas que mais me chamou atenção durante a apresentação dos professores foi o gráfico do desempenho de um conjunto de alunos de várias escolas (estaduais, municipais, particulares e especiais), em cinco cidades brasileiras (Salvador, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Campinas e Campo Grande), ao longo de cinco aplicações de testes de português e de matemática. Os testes serviram para acompanhar o desenvolvimento dos alunos nas séries iniciais dessas disciplinas.

O gráfico revela alguns dramas ou tragédias. Primeiro, ao ingressarem nas séries iniciais do Ensino Fundamental os alunos da rede pública têm desempenho muito inferior aos alunos da rede privada e especial. Isto é explicado pelo grave desnível socioeconômico que temos no país. Alunos pobres vão para escolas públicas. Alunos ricos vão para escolas particulares. Por terem melhores condições e acesso a mais oportunidades educacionais, os alunos mais ricos invariavelmente têm melhor desempenho que os alunos pobres. Moral dessa tragédia: o aluno pobre, além de ser pobre, já começa sua vida acadêmica perdendo. É um perdedor de entrada.
A segunda tragédia é que, ao logo dos anos (pontos 2, 3, 4 e 5 do eixo “x” do gráfico) a diferença não diminui e, em matemática, chega a aumentar. Moral dessa tragédia: o aluno pobre, que começa perdedor, não terá nenhuma chance de se recuperar e competir com o aluno mais rico, pois sempre estará em desvantagem. É um perdedor de saída.



Na medida em que a educação é entendida como uma ferramenta para eliminar as diferenças sociais e econômicas, o retrato dessa avaliação nos indica que, no Brasil, a educação está sendo utilizada para manter um “apartheid” permanente entre ricos e pobres. O pobre será um perdedor durante toda vida.

Saber que o filho do pobre, no Brasil, sempre estará em desvantagem e que a educação brasileira reproduz um sistema excludente é a pior das tragédias da semana.

Fontes:


Apresentação dos professores citados

Imagem de Salvador Dali

Um comentário:

Jorge Amaral disse...

É verdade companheiro Arturo, a tragédia da perversa exclusão do mais pobre na educação brasileira não deixa espaço para o resgate da cidadania no grande oceano de desigualdades que banha a nossa gente. E sobre esse brutal desastre com graves consequências para as próximas gerações, parece não ser prioridade noticiar...

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