terça-feira, 3 de março de 2009

Conversas de cabeleireiro

Quatro coisas me incomodam bastante quando vou a um cabeleireiro. A primeira é ter que ir até lá. Ter que aparar o cabelo é, para mim, uma enorme perda de tempo. A segunda coisa é sair de lá (do salão do cabeleireiro) cheio de fiapos de cabelo na camisa, pinicando as costas e pescoço, e ter que passar o resto do dia com essa mesma camisa cabeluda. A terceira é notar que, cada vez mais, as minhas entradas crescem assustadoramente e que eu não posso fazer nada contra isso, a não ser rezar para que não cheguem à nuca. Ao ver os meus irmãos, noto que é uma questão de tempo para o meu desespero tomar conta de tudo. A quarta e última coisa é, além de tudo, não encontrar um cabeleireiro profissional que saiba manusear uma tesoura adequadamente.

Vou generalizar, mas sei que tem exceções. Em Salvador não existe cabeleireiro que saiba cortar cabelo com tesoura. Pronto! Aqui, os cabeleireiros se acostumaram a cortar na máquina. A pergunta sempre é a mesma: é na máquina? Se a resposta é não, eles te olham meio estranho e demoram mais que o normal para deixar o cabelo mais curto. Isso é tão claro para mim que eu não criei fidelidade a nenhum cabeleireiro nestes 19 anos na Bahia.


A qualidade do corte, neste caso, não se relaciona com o preço. Lembro do barbeiro da feira central de Campina Grande (lá não tem cabeleireiro). Por algo em torno de R$ 5, você cortava o cabelo e ainda tomava uma sopa. Quando eu ia ao colégio, logo cedo e no frio da manhã, o corte do cabelo e a sopa eram reconfortantes. Os feirantes, que vinham de todas as cidades da redondeza, paravam lá também. Algo parecido eu encontrei em Santo Antônio de Jesus (BA), por trás do principal hotel da cidade e ao lado da feira. Não tinha sopa, mas o barbeiro sabia utilizar uma tesoura de cortes avançados. Destreza esta que aprendera em cursos feitos em São Paulo.

Em Salvador, ir a um cabeleireiro qualquer, sem o interesse de saber quem ia meter a tesoura, era uma rotina até encontrar Ton. Ton além de cortar bem com a tesoura normal, também sabe utilizar aquela outra de cortes mais avançados. O melhor é que Ton só cobra R$ 10,00 (R$ 12,00 no cartão), o que é barato para Salvador.


Apesar de tantas coisas negativas no salão de cabeleireiros, uma me agrada: escutar as estórias das pessoas que mal se conhecem, mas, aparentemente, são unha e carne. É justamente um desses papos que vou relatar hoje. Estava eu cortando o cabelo com Ton quando ele puxou conversa com uma Perua que estava fazendo as unhas logo ao lado.

Ton: Passou o Carnaval onde?
Perua: Aqui mesmo.
Ton: Também. Nesse Carnaval só teve porrada. Foi pau prá tudo que é lado. Violência pura. Pau, pau, pau.
Perua: É...
Ton: A polícia meteu cacete em tudo, menina.
Perua: Que horror!
Ton: Vinha de lá cada negão. Sabe? Cada um com seu cacete na mão, dando porrada na multidão.
Perua: Num foi só na pipoca que deu confusão não. Li aqui que Dado Donabella fez o maior barraco lá no Rio.
Ton: No futebol é a mesma coisa. Ó-pá-i-ó.
Nesse momento, passavam na TV do salão as cenas de porrada que os policiais deram numa partida do Campeonato Baiano de Futebol. Como papo de salão é coisa volátil, só foram passar as cenas que o assunto mudou.

Ton: E você ficou com alguém?
Perua: Ninguém. Miserê total. E você?
Ton: Fiquei com Dalila?
Perua: Dalila?
Ton: Menina, aquela música de Ivete: Cadê Dalila? Dalila é a nova gripe. Gripe do carnaval. Todo mundo pegou Dalila. Hahahah!!!

A Perua fez uma cara de (des)entendida e mudou de assunto.

Perua: Gostei mesmo foi de Cláudia Leite. Tava em forma.
Ton: Dilma também. Você viu o decote de Dilma, lá no Sambódromo? Ela tá podendo. Tava até menos feia.
Perua: É tudo plastificado.
Ton: E eu não sei? Dizem que ela até evitou pular muito.
Perua: E foi?
Ton: Senão caia tudo. Hahahahah!!!
Perua: Você é terrível.
Ton: É não menina. Esse povo acha que agente não nota uma plástica daquelas.
Perua: Quanto ela pagou?
Ton: Sei lá.


Mudam o assunto.

Perua: Prá falar em plástica, você tá vendo Caminhos da Índia?
Ton: qué-que-tem?
Perua: Torloni tá arrasando.
Ton: Pode ser. Mas, acho o cabelo dela ridículo. Divertido mesmo é o BBB.
Perua: Por que?
Ton: Menina, o último paredão foi uma baixaria total. Eu ri muito.


O assunto muda novamente.

Perua: Sabe aquela minha irmã que mora em São Paulo?
Ton: Aquela que veio aqui no mês passado?
Perua: Sim, ela mesma. Ela me deu uma ampola de fortalecimento da raiz parecida com essa que você tem aqui.
Ton: Qual é a marca?
Perua: Sei não. Mas, começava com P.
Ton: Presta não! É de terceira.
Perua: Como assim?
Ton: É uma desgraça, quebra tudo. Mas, você não passou na cabeça não, né?
Perua: Não, não...
Ton: Bom mesmo é esse que tenho aqui... dá L’Oréal.


Por um minuto a Perua ficou muda. Sem reação. Talvez refletindo sobre a situação. Neste intervalo, Ton busca o espelho e diz:

Ton: Pronto, terminei. Gostou?
Arturo: Divino!

4 comentários:

Alice Senna disse...

kkkkkkkkk não tem como ficar séria!! que memória hem arturo. E o Tom é o tal que Gustavo indicou? hum... esse negócio está ficando interessante. Até mereceu postagem!! rs. Qer dizer que fica antenado nos papos... ah bom saber!! Bjss

Jorge Amaral disse...

Muito legal esse estudo sociológico e estético do couro cabeludo, mas me diga companheiro, além das quatro coisas que você identificou como incômodas, que outras tantas você identificou como "divino" e não foram publicadas???

Arturo Cavalcanti Catunda disse...

No bojo da situação, acho que o vale mesmo, o que mais me interessa, é a conversa e os assuntos tratados nelas, que me dão inspiração para o blog. :)

Unknown disse...

Companheiro Arturo

Você como presidente do Partido da Lógica Racional (PLR) não precisa passar por esses vexames, senão vejamos:
1) Não precisa perder tempo cortando o cabelo, pode deixar crescê-lo “ad infinito”, uma vez que, para o seu projeto de se tornar o campeão de windsurf de Lauro de Freitas, cabelos longos contribuiriam muito para compor o tipo.
2) Quanto aos cabelos pinicando no pescoço, um banho resolve. Talvez não tenha lhe ocorrido esta solução.
3) Quanto às entradas no cabelo, nem a lógica resolve. Sinto lhe dizer que vai piorar e uma terapia pode ajudar a resolver este trauma.
4) No que se refere a cabeleireiros que cortem cabelos com tesoura, sugiro que você faça uma ampla pesquisa junto aos sócios do clube Edward Mãos de Tesoura de Lauro de Freitas e Salvador. Nessa pesquisa você buscaria identificar quais profissionais já possuem esta competência bem desenvolvida e, a partir daí e com base na seleção de indicadores (idade, sexo, local de trabalho, capacitações realizadas, tempo de experiência, etc.), escolhe um para todo o sempre.
5) Quanto a ficar bisbilhotando conversa alheia, cuidado, pois, você pode sofrer um impeachment e ser deposto da direção da PLR.

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